Plantas Que Curam

Ipomoea carnea
Ipomoea carnea

Mata Pinto, Ipomoea carnea: Propriedades, toxicidade e usos tradicionais

A Ipomoea carnea, pertencente à família Convolvulaceae, é uma planta amplamente distribuída em regiões tropicais e subtropicais. Conhecida popularmente por diversos nomes, como algodão-de-pântano, algodoeiro-bravo, canudo-de-pito, campainha, mata-pinto, majorana, salsa-branca, salsão e mata-cobra, essa espécie desperta interesse tanto por suas propriedades medicinais quanto por sua toxicidade.

Espécie nativa da América do Sul, a Ipomoea carnea é frequentemente encontrada em áreas úmidas, margens de rios e solos argilosos. Suas flores, geralmente rosadas ou arroxeadas, têm formato de funil, característica comum entre as plantas da família Convolvulaceae. Seu crescimento rápido e resistência a diferentes condições ambientais fazem dela uma planta comum em diversas paisagens naturais e agrícolas.

Contudo, sua composição química levanta importantes questões quanto ao seu uso, seja na medicina popular ou na interação com animais e humanos.

Composição química e efeitos fisiológicos

A Ipomoea carnea contém diversos compostos bioativos que justificam tanto suas aplicações medicinais quanto sua toxicidade. Entre os principais componentes químicos encontrados na planta estão:

Estudos indicam que a planta apresenta efeitos neurotóxicos, principalmente devido à presença de alcaloides tropânicos, compostos conhecidos por sua ação no sistema nervoso central. A ingestão de folhas e brotos pode causar sintomas neurológicos, incluindo desorientação, tremores e convulsões, além de efeitos alucinógenos em humanos e animais.

Toxicidade e impacto na pecuária

A toxicidade da Ipomoea carnea é um fator de preocupação, especialmente na criação de gado e caprinos. Relatos de intoxicação em rebanhos demonstram que animais que consomem a planta apresentam sinais clínicos de neurotoxicidade, como ataxia (falta de coordenação motora), convulsões e alterações comportamentais.

Um estudo conduzido por Tokarnia et al. (2002) analisou a incidência de intoxicações em bovinos no Brasil e concluiu que a Ipomoea carnea pode ser fatal quando ingerida em grandes quantidades. Os sintomas observados incluem fraqueza muscular, salivação excessiva e paralisia progressiva, levando o animal à morte por insuficiência respiratória.

A presença de swainsonina, um inibidor da α-manosidase, também tem sido associada a quadros de intoxicação crônica, semelhantes aos observados na intoxicação por outras plantas do gênero Ipomoea, como a Ipomoea asarifolia(Tokarnia et al., 2012).

Risco para humanos

Em humanos, a toxicidade da Ipomoea carnea também é motivo de atenção. Há registros de indivíduos que, ao mastigarem folhas ou brotos da planta, relataram experiências alucinógenas, seguidas de sintomas de desorientação e confusão mental. Embora o mecanismo exato desses efeitos não seja completamente compreendido, acredita-se que os alcaloides presentes na planta interfiram na neurotransmissão, alterando a percepção sensorial e a cognição.

Dessa forma, o uso recreativo ou empírico da planta pode trazer sérios riscos à saúde, incluindo toxicidade hepática e neurológica.

Aplicações na medicina tradicional e precauções

Apesar de sua toxicidade, a Ipomoea carnea tem sido utilizada na medicina popular para o tratamento de diversas condições. Na fitoterapia tradicional, são atribuídas a essa planta propriedades anti-inflamatórias e antimicrobianas, sendo empregada no alívio de erupções cutâneas de origem alérgica.

Entretanto, é fundamental destacar que o uso medicinal da planta deve ser feito com extrema cautela. Devido à presença de compostos tóxicos, a automedicação com partes da Ipomoea carnea pode levar a efeitos adversos graves. A falta de estudos clínicos controlados sobre sua segurança e eficácia reforça a necessidade de orientação profissional antes de qualquer uso terapêutico.

A Ipomoea carnea é uma planta que desperta interesse tanto por suas propriedades químicas quanto pelos riscos associados ao seu uso. Enquanto algumas comunidades a utilizam para fins terapêuticos, sua toxicidade impõe um alerta quanto ao consumo inadvertido por humanos e animais.

No contexto da pecuária, a presença dessa planta em pastagens deve ser controlada para evitar intoxicações no rebanho. Já na medicina popular, o conhecimento empírico sobre suas propriedades deve ser complementado por pesquisas científicas para que sua aplicação seja segura e eficaz.

Assim, o estudo da Ipomoea carnea reforça a importância de um olhar crítico e multidisciplinar sobre as interações entre plantas, saúde e meio ambiente.

Referências

  • TOKARNIA, C. H.; DÖBEREINER, J.; PEIXOTO, P. V. Plantas Tóxicas do Brasil para Animais de Produção. Rio de Janeiro: Helianthus, 2002.
  • TOKARNIA, C. H.; POTT, A.; POTT, V. J.; PEDROSO, P. M. N. Plantas Tóxicas no Pantanal: Impactos e Estratégias de Controle. Brasília: Embrapa, 2012.
  • PANDEY, V.; CHAUHAN, S. V. S. Toxicity and Pharmacological Properties of Ipomoea carnea: A Review. International Journal of Phytomedicine, v. 7, p. 234-241, 2015.
  • MORAIS, O. R.; SOUZA, M. L. Fitotoxicidade e Propriedades Medicinais das Convolvulaceae no Brasil. Revista Brasileira de Botânica, v. 32, n. 2, p. 185-194, 2010.